Você acha sua vida difícil?Então venha conhecer conosco o que são mulheres prostituídas, ex-presidiárias e que precisam sustentar filhos, marido e muitas vezes os netos.
01/09/2011, quinta feira. Sob o tema perseverança, a D.A.P.V foi atrás de casos reais que retratassem o sentimento ao pé da letra.
Quem nos recebeu na Associação foi a coordenadora administrativa Rosemary Aparecida, que nos falou um pouco de sua experiência de 15 anos trabalhando com mulheres do submundo, como ela mesmo definiu.
“Já recebemos todo tipo de sofrimento para com a mulher. Prostitutas, ex-presidiárias, mulheres em condições subumanas de vida, vícios e abusos sexuais. Vimos muitas alegrias, como no ano passado onde 21 mulheres conseguiram emprego registrado e viviam nestas condições.”
Sobre as dificuldades, ela afirma: ”Não há, pois as mulheres são abertas. Elas que nos procuram, ouvimos o que elas tem a dizer e ajudamos a fortalecê-las.Mas há sempre mais a fazer e talvez esta seja uma dificuldade que eu tenho.Acredito que poderia fazer mais.Mas o tempo e o trabalho são de Deus.Fazemos por amor.Somente por amor.”
Sobre a missão, objetivo da Associação, Rosemary explica: “Começamos com a evangelização e depois passamos para os cursos semi-profissionalizantes. Percebemos que o que elas mais precisam é de auto-estima positiva. Então fazemos um trabalho de evangelização e fortalecimento. Sabemos que bordado não resolve todos os problemas financeiros, mas é um estímulo para as mulheres perceberem que são capazes e buscarem emprego com carteira registrada e tem dado resultado.”
Um dos resultados comentados pela Rose foi exatamente uma de nossas entrevistadas, Tereza Bueno, a Tetê. Ela tem 64 anos e há cinco anos trabalha na Associação com registro em carteira.
A história dela, infelizmente se assemelha com a de muitas outras mulheres. Trabalhava o dia todo em um bar em Jundiaí, que também era uma casa de programa. Já tinha filhos e viu na prostituição uma forma de ganhar mais dinheiro para cuidar deles.
“A vida não é fácil. As pessoas costumam julgar que temos a vida fácil. Não é nem um pouco. Aguentamos todo tipo de humilhação e eu pensava 10 vezes antes de fazer um programa. Mas eu precisava sustentar meus filhos. Depois de 18 anos nesta vida, eu conheci a Cristina, que falava com as garotas de programa na rua mesmo, antes de ter a Associação e resolvi mudar. Sai desta vida.”
Claro que não ocorreu de um dia para o outro, como Tetê mesmo comentou. Ela precisou de muita coragem e perseverança para dar um basta em uma vida que não a agradava: ”Continuei trabalhando durante o dia e quando abriu a Associação, eu comecei a participar. Quando estava caminhando bem, minha filha foi presa. Tive todo o apoio da Associação que me ajudou em tudo e nunca me julgou. Ajudaram a cuidar dos meus netos, nas visitas à cadeia, totalmente humilhante para nós mulheres. Enfim foi uma das batalhas em minha vida.”
Ela continuou seu testemunho de vida: ”Minha filha saiu da cadeia, conseguimos creche para meus netos em tempo integral, comecei a trabalhar aqui na Associação. Tudo ia bem, até que em uma manhã eu chego aqui e a Rose me mostra, com dor no coração, que meu outro filho havia sido preso (seus olhos se enchem de lágrima pela primeira vez na entrevista). Foi uma dor e tanto para mim, não é fácil ver seu filho no jornal, sendo preso. Minha batalha começou de novo. Visitas, cuidar dos filhos dele, trabalhar para sustentar netos e o filho preso. Mais uma vez a Rose, a Cristina e todas as mulheres da Associação me ajudaram. Não me abandonaram.”
Tetê pensou em abandonar tudo e desistir da vida?”Ah minha filha, vontade dá!Pensei diversas vezes, mas não podemos abandonar tudo.Consegui muitas coisas.Hoje meus filhos estão trabalhando, meus netos estão aí bem.A vida não é só trabalho e problemas.Aproveito minha vida também,gosto de sair para dançar.Gosto de um forró(risos).”
Este ânimo e vontade de viver estão estampados em seu rosto muito sofrido, mas com olhos perseverantes e sorriso consolador. Tudo o que passou só a fortaleceu e a tornou este exemplo de vida, de mulher, que com toda a dor ainda tem tempo de ajudar outras mulheres na mesma condição que um dia ela esteve. Só para completar esta história, Tetê tem um filho adotado, pois uma das moças que trabalhou com ela em programa, engravidou e ia tirar a criança. Ela salvou esta vida que hoje esta muito bem e é uma das alegrias dela.
Outro exemplo de vida que encontramos nesta Associação foi de Maria Felícia. Ela tem 65 anos e é uma das voluntárias.
Felícia teve a vida bem semelhante a de Tetê: ”Trabalhava em um hotel no centro de Jundiaí, mas assassinaram o dono e eu levei dois tiros, um na cabeça e outro nas costas (ela nos mostra a bala ainda em seu ombro e as cicatrizes, que são visíveis, na cabeça). Eu não tinha dinheiro para a medicação nem nada. Já conhecia a Cristina da época em que ela falava nas ruas, ela ficou sabendo da minha situação e me ajudou com tudo. Remédios, roupa, alimento. Fiquei um tempo internada, não morri porque não chegou mesmo a hora. Quando melhorei, tive que continuar trabalhando, não tinha aposentadoria nem ninguém para me ajudar. Ano passado consegui uma aposentadoria pelo acidente, depois de 18 anos. Desde então, venho para a Associação, faça chuva ou faça sol, sou voluntaria aqui. Faço o que posso. Mas venho. Moro em Campo Limpo, num barraco. Saio de lá cedinho para estar aqui às 8.Retribuo um pouco o tanto que elas fizeram por mim.”
São exemplos como este que nos fazem refletir como a vida é mais que tudo o que vivemos. Há pessoas que realmente batalham e que sofrem, mas que permanecem querendo viver. Mesmo diante de todo sofrimento, ainda tem tempo para ajudar os outros. Pessoas perseverantes como as mulheres da Maria de Magdala, Tetê, Felícia e as mulheres que fizeram isto acontecer, Cristina, Rose e tantas outras.
A associação Maria de Magdala é um segmento da Pastoral da Mulher. A Pastoral da Mulher completa 29 anos em 12 de outubro e a Magdala, que é um braço da Pastoral da Mulher para reinserção social, existe há 16 anos. São 52 mulheres assistidas regularmente e aproximadamente 90 esporádicas. Oferece cursos semi-profissionalizantes para mulheres excluídas e sobrevive graças a parcerias da prefeitura, mitra diocesana, empresas particulares e principalmente da comunidade.
Quer Ajudar? A associação está aberta para voluntariado e doações de roupas, sapatos e acessórios novos e seminovos. Mensalmente são realizados bazares com as doações e, três vezes por ano, almoços beneficentes para manter a casa.